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Welcome, take a seat.

Estou ao seu lado

Happy Virus, Friends With You (2015)

Happy Virus, Friends With You (2015)

O músico Nick Cave tem um blog fantástico, no qual responde perguntas de fãs. Ele está no post #102, em que responde sobre o motivo de suas canções não serem tão politizadas quanto o fã que o questionou gostaria. A resposta é excelente e vale a leitura. Mas o tema deste post é a publicação #100 do blog.

Hajalti, da cidade de Reykjavik, na Islândia, pergunta:

Hoje, minha pergunta é pessoal: se você tivesse um anel de ouro que seu filho herdaria um dia, o que você gravaria dentro do anel? (Atualmente, estou fazendo um anel que repassarei ao meu filho depois que eu me for).

A resposta de Nick:

Dear Hajalti,
Eu teria inscrito
Estou ao seu lado
dentro do anel.

É uma resposta simples, mas que contém um grande significado e valor. As conexões que construímos ao longo da vida têm muito disso, esse sentimento de estarem acima de tudo, mas também de nos sustentarem. Estão, desta forma, ao nosso redor, protegendo-nos do marasmo, da falta de graça, da monotonia, da chatice e do sofrimento que podem ser a vida.

Eu já usei bastante o Instagram para registrar momentos de conexão com a minha família. Há um post de 2017 em que refleti sobre minha conexão com o passado entre nós:

(1) O passado é, para quem tem sorte, origem infinita de significado, alento, alegria, equilíbrio e desequilíbrio. (2) O equilíbrio vem das bases que foram criadas, os laços firmados. O desequilíbrio é mais difícil de explicar, mas talvez essa foto ajude. Eu já tive momentos de felicidade exemplares. Esse é um deles: brincar com o Rodolfo quando pequenos. E quando meus pais estavam junto, com Clara também alguns anos depois, a coisa ficava ainda mais intensa. Ao ver uma foto dessa, meu cotidiano se desequilibra e eu percebo como é possível ser mais feliz. O meu próprio exemplo passado me alimenta e eu enxergo o que importa. (3) Para quem não tem sorte, o passado pode ser um fardo, mas há meios de superá-lo. Eu não sei como, mas muita gente consegue. É preciso desejar força e sorte para quem precisa. (4) Tal é a função máxima que demos para as fotos: de registro visual a ajudante da lembrança. Anos atrás, ainda na casa dos meus pais, eu acessava os álbuns de fotos impressas, normalmente, resgatados por meus próprios pais em alguma arrumação. Agora o mais comum é eu retornar vez ou outra a minha timeline do Instagram. Então, os momentos menos destacados na lembrança ganham cor e é impossível não sentir carinho e sorrir. (5) Meu pai me manda fotos como a deste post pra mim por mensagem de vez em quando. É bom pra ele. É bom pra mim.

Quando eu voltei de férias na América do Norte com Clarissa, também em 2017, eu registrei desta forma nossa parceria em outro post no Instagram:

(1) Crescer é preencher a vida de significados. E se apropriar deles. Se os significados forem positivos, a vida é positiva. E o resto a gente resolve. (2) Nem sempre temos sorte de ter a facilidade em identificar significados positivos. A tendência, na verdade, é nos indignarmos com tudo que há de errado. Com todos os significados negativos. E eles têm um poder impressionante. (3) Nesse sentido, a nossa luta é por construir, porque a destruição (ou desconstrução) é natural. (4) Minha vida se enche de significado à medida que vivo. E eu vou ganhando algo que é meu, mas acima de tudo, sou eu. E me fortaleço. E consigo enxergar o mundo com mais tolerância e paz. Que são elementos de que ele sempre precisará. (5) A gente nasce separado, incompleto. E vai juntando as pecinhas. Tão lindas as pecinhas.

Já em 2018, também em um post de Instagram, registrei assim a minha parceria com meus pais:

(1) Eu cheguei a uma idade em que meus pais viveram mais comigo do que sem mim. Isso quer dizer que as identidades de Roberto e Clarice são mais carregadas de paternidade e maternidade do que não. São pais chancelados pelo tempo. (2) Eu sou parte deles e serei para sempre, para cada um. (3) Minha identidade ainda é apenas de filho, como foi a de meu pai muito antes de mim, nesta foto com meus avós. (4) Nós somos esse crescente de peças e significados que se anexam pelo tempo. (5) O tempo, que mais une do que separa.

Mencionei a separação ao fim desta última mensagem, porque sei que muitas vezes é difícil se manter próximo de pessoas, sejam familiares ou amigos. Diferenças e sentimentos entram no caminho e criam muros difíceis de transpor. Mas a solidão é arrasadora para qualquer um. E estar perto, mesmo depois que a gente se vai — como será o caso de Hajalti e seu filho ao ganhar o anel — será sempre muito importante. Então, fique por perto. O resto é distância.


A imagem deste post é do coletivo Friends with You, cuja fofura não parece ter limites.