O infinito é um sentimento
Eu tenho um mecanismo de cálculo pelo qual construo equações para compreender minha vida. Para isso, eu reúno os elementos, como pessoas, trabalho, atividades cotidianas, planos de futuro, lembranças do passado, saúde, movimentos do mundo. Somo tudo e tiro médias para me entregar um resultado que calculo até ficar positivo. É comum que eu execute o cálculo quando algo dá errado ou está desconfortável: um problema no trabalho, um contratempo em casa, uma briga difícil de resolver, um plano frustrado. Até então, eu sempre obtive êxito no cálculo, ainda que, em algumas situações, ele demore mais a ser processado.
Desde o nascimento do Matias, meus cálculos ficaram mais confusos. Cada vez que eu o vejo sorrir, uma alegria sem fim se apossa de mim. Quando ele chora desesperadamente — como só os bebês sabem chorar — eu me compadeço como nunca. Mas agora, quando eu executo o cálculo e o Matias participa dele, eu não recebo um resultado acessível. E não é que o resultado seja ruim. É como se ele fosse tão intangível que eu não consigo processar. Recebo uma mensagem de erro, como se faltasse espaço em disco ou memória RAM para assimilar o resultado.
Eu sinto que não compreendo ainda a dimensão do que é ter um filho. Eu interajo com ele, brinco, faço-o sorrir, danço, conto histórias, carrego no colo, ouvimos música, dublo-o como se ele conversasse comigo, coloco pra dormir. Mas é como se isso fosse só o começo de uma história cujos benefícios e desafios ainda estão bem escondidos, como grandes mistérios de nós dois. Talvez, eu precise expandir a memória RAM do meu coração, dia a dia, e seja o Matias o fornecedor do espaço. Se for, que lindo será aprender a amar ainda mais e aprender também a calcular o amor de uma forma diferente da que calculei até aqui. O infinito é um sentimento.
Eu gosto de ilustrar meus posts com peças de arte. E para a deste post eu escolhi uma cujo significado me emocionou. A equação que ilustra esse texto é a Identidade de Euler. Uma Igualdade Matemática só pode ser verdadeira sob certas condições, mas uma Identidade Matemática é uma igualdade que permanece verdadeira para quaisquer valores utilizados. Diz que a Identidade de Euler é a mais famosa das identidades matemáticas. A sua beleza está em relacionar cinco constantes matemáticas (e, pi, i, 0 e 1) e três operações básicas (adição, multiplicação e exponenciação). Matemáticos apaixonados teceram elogios ao longo do tempo para a equação.
Como um soneto de Shakespeare que captura a própria essência do amor ou uma pintura que traz à tona a beleza da forma humana mais profunda, a equação de Euler alcança o âmago da existência. - Kevin Devlin
Benjamin Peirce, filósofo, matemático e professor americano do século XIX na Universidade de Harvard, depois de provar a identidade de Euler durante uma palestra, afirmou que a identidade
… é absolutamente paradoxal; não podemos entendê-la e não sabemos o que isso significa, mas nós provamos e, portanto, sabemos que deve ser a verdade.
Parece até a forma que eu me sinto em relação aos meus cálculos de vida depois que Matias apareceu.
Essa peça em neon é trabalho do artista Andrea Galvani, em meio a um projeto chamado INSTRUMENTOS PARA INQUIRIR NO VENTO E NA TERRA AGITADA. Após conversas com um amigo físico, ele decidiu reunir equações que carregam elementos significativos para a forma com nos relacionamos. Ele trabalha, segundo as próprias palavras, com uma constelação de números. Há uma entrevista dele em vídeo na qual dá pra acessar melhor suas ideias.