O limite do desequilíbrio
Eu tenho corrido pela L2 Norte, uma das pistas que cortam Brasília de ponta a ponta. É uma forma de evitar o contato com pessoas na rua. Nesta semana, ao passar pela altura da 409 norte, notei um carro parado na faixa do meio com o pisca-alerta ligado. Eram umas 19h e fui tentar ajudar. Ao chegar ao lado do carro, percebi duas moças em um clima meio desconfortável. Cheguei a ouvir um grito moça sentada no banco do passageiro, que, a princípio, imaginei ser por frustração em relação a uma possível displicência da motorista no trato com o carro. Ao oferecer ajuda, recebi um “obrigado, moço, não precisa”. Insisti, porque o perigo não era só delas, mas dos demais carros que passassem pela pista. Ela seguiu insistindo que não precisava, mas eu fui inconveniente e já me preparei para empurrar o carro, enquanto fazia gestos para os carros que vinham desacelerarem. Percebi que o carro estava travado, com o freio de mão puxado, enquanto um rapaz que estava numa parada de ônibus perto se aproximava para ajudar e a moça no banco do passageiro gritava mais uma vez. A motorista de um carro que passava em velocidade lenta também estava se dispondo a ajudar quando o Ford Ka da dupla ligou, com a motorista falando “olha, pegou”. Eu andei para o lado e vi o pneu da frente do carro baixo e sugeri à motorista que talvez estivesse furado. Ela respondeu que provavelmente era esse o problema e saiu com o carro.
A resposta dela foi quase uma confirmação de que o problema ali não era na mecânica do carro, mas na relação entre as duas. A moça parou o carro no meio de uma pista porque estava tendo uma discussão de relacionamento com a companheira.
Segui correndo e fiquei pensando no quanto nossas emoções orientam nossas ações, mas também têm impacto nas vidas de outras pessoas. As duas ali, isoladas no próprio mundo de problemas, poderiam ter causado um acidente que prejudicaria muito mais do que elas. Momentos de instabilidade como esse são normais para todos nós, mas a convivência em sociedade demanda mantê-los sobre controle para evitar impactos negativos maiores. O conflito e o desabafo têm seus lugares em meio a nossas emoções e relações, mas que sejam locais seguros na medida do possível.